domingo, 5 de maio de 2019

Conto: Besta de Madeira - por W. Valek


Besta de Madeira

Manhã gelada. O céu me encara carrancudo deixando escapar uma luz embaçada por um todo cinza, como a placa peitoral mal polida e esquecida de um gigante debruçado sob o mundo para observar Midgard. Na cela do meu cavalo percorro vagarosamente a costa rochosa da minha terra, o frio me abraça como um velho amigo traveço, fazendo doer os ossos de um velho guerreiro. Minha capa garante certo calor num mundo onde meu halito pode ser visto no ar, trazendo a lembrança da infância quando eu fingia ser um grande dragão.

A vista já cansada corre o horizonte azul na busca de um dragão, um navio dragão. Numa embarcação outrora naveguei o ventre do mar, deixando para trás muitas memórias perdidas na espuma branca que surge no peito do navio dragão.
       
Lembro do vento colhido pelas velas, as grandes asas da Besta de Madeira. Sim,  esse era o nome, a Besta de Madeira eu o chamei. Lembro do oceano bravio querendo nos levar as profundezas, do gosto de sal na boca e da chuva doce que lavava nossa alma em dias abençoados por Thor. Minhas mãos ainda ásperas das vezes que remei rio acima, águas onde os inimigos nunca esperariam nossa passagem, mas a Besta de Madeira nos levava até o coração de terras onde íamos com aço e voltávamos com ouro e prata.

Além do horizonte fomos, sem nunca temer a borda do mundo. Muito vi, muito  provei, muitos prazers encontrei. Num dia de saudade venho aqui no ponto mais alto da costa olhar ao longe, e ver o fantasma do Besta de Madeira passar, levando embora meu tempo de juventude e a glória da minha vida.

        W. Valek



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